Estresse
Miséria me deram de herança
Comemorei de prato vazio o dia das crianças
Monotonia, guerra dentro do barraco
Que agonia, o quê é que eu faço?
Será que 157 resolve meu problema?
Aqui não tem ator, nem Jackie Chan pro cinema
Necessidade na favela é o que define
É, caí no mundo, fui pro crime
Sem me descabelar, sangue frio, pura calma
Primeiro ato, os boyzinhos ficaram com trauma
A vida deles pra mim não vale nada
E eles querem ver meu corpo na calçada
Faço a oração, rezo minha prece
Se não tem fé, não acredita, esquece
Eu sou um predador na luta contra a fome
Mó comentário no rádio dos home'
Atenção todas as viaturas, elemento suspeito
Aparentando 27 anos, negro, aproximadamente 1,80m
Trajando camisa preta e calça larga
Visto pela última vez no parque das nações, QAP
O jornal regional transmite a notícia
O rabecão, o IML, a perícia
A ambulância do resgate, a polícia
Que traz no olhar a maldade, a malícia
Pra minha mãe prometi dar bom exemplo
Mas na vida cada coisa tem seu tempo
De mente engatilhada, eu lamento
E a burguesia financia meu tormento
A desigualdade gerou isso aqui
Sobrevivente ao caos, eu resisti
Pra uns a vida é bela
Pra mim o que restou foi a favela
Sou militante nessa guerra
Meu sonho? É ser feliz de verdade
E não ter fuzil pra ser personalidade
Eu tava meio sumido, mas aí, tô de volta
Na pura calma, expressando minha revolta
Sobreviver por que será que é tão difícil, irmão?
Na ganância do dinheiro, destruição
Quero ser justo e fugir das armadilhas
É, e honrar minha família
Dias de chuva, rajada sobre o mar
O mar é a favela, o mar é a favela
Manhã escura, chove sem parar
(Sem parar, parceiro, chove sem parar)
Dias de chuva, rajada sobre o mar
O mar é a favela, o mar é a favela
Manhã escura, chove sem parar
(Sem parar, sem parar)
Mano, que tempo é esse? Desde ontem é chuva
De calça e blusa, mó frio, cadê minhas luvas?
Com esse tempo é embaçado ir pra rua
Na paz ou no sofrimento, cada um na sua
Aí eu paro e penso, não jogo o lenço
O clima é tenso e o mundo é tão imenso
Meu povo é carente, tem bastante gente
Da solidão, senhor, livrai os inocentes
O presidente sempre esteve ausente
E na pobreza muita gente virou crente
E na neurose outros descarregaram o pente
Outros viraram a mente, ficaram inconsequente
Nesse mundo cabuloso e delinquente
Tudo isso fez pressão na minha mente
Quando criança eu sonhava em ser atleta ou doutor
Virei um monstro, o sistema me criou
Felizmente, a mãe não perde o amor
Quando nasci, só ela me registrou
Hoje é meu aniversário, quem será que se lembrou?
'Pera aí, 'pera aí, quem será? Quem me ligou?
Alô
Oi filho, feliz aniversário!
Ô, mãe, muito obrigado! A senhora lembrou?
A mãe tá muito feliz por você
É, eu também to muito feliz (que Deus te abençoe)
Cabeça erguida, meu filho
A senhora lembra que...
O neguinho lá da favela, quem diria?
O inimigo número um da burguesia
(Corre, a todo momento muito gente sofre) sofre, sofre muito
(Seja na Ceilândia, no Capão, ou na Cohab) pois é, mãe
Aqui também pega, você sabe (eu sei, claro que sei)
(Mas vai que vai) vou
(Tá cheio de gente sem compromisso)
Muita gente, muita gente sem compromisso
E é desse jeito, é por isso que...
É só zun-zun-zum, ti-ti-ti, blá-blá-blá
Mas aqui o ativista entrou em cena e é pra somar
Denis Preto Realista, ei, ei, ei
Alto lá, sou eu na fita
Declarado inimigo do Estado
Um prisioneiro da maldade libertado
Sei que é difícil encontrar a paz
Mas tudo isso aqui me satisfaz
Dias de chuva, rajada sobre o mar
O mar é a favela, não é, não é novela
Manhã escura (chove), chove sem parar
(Chove sem parar, irmão, sem parar)
Dias de chuva, rajada sobre o mar
O mar é a favela, o mar é a favela
Manhã escura, chove sem parar
Alagando barracos e vielas
Ô, louco, é que muita gente não acreditava, véi'
Eu falei pra você há cinco anos, ia chegar
Tá ligado, Denis? Você se lembra, né?
É desse jeito, rapá, depois de nós é nós de novo, vai!
É isso mesmo, Gog, temos que raciocinar
Usar a mente com cautela pra nos expressar
Me negaram saúde, emprego, educação
Carro importado eu nunca fiz questão
Só não queria viver na humilhação
Cadê o direito e o valor do cidadão?
Abismo sem luz, escuridão
Sinistro é esquecer de Deus e abraçar o cão
Meu passado, Gog, foi ruim
Mas será que ser bandido foi o sistema que escolheu pra mim?
Justiça cega, já pensou se eles me pegam?
Mais um favelado assassinado ou preso numa cela
Então, se repressão deixa sequela
Mesmo assim, sou filho dessa terra
Eu quero, eu posso, eu sou
Tudo que muita gente não acreditou
Virei a febre depressiva do sistema
Pra sociedade brasileira, um problema
Aquele que não para, não cala quando fala
Se meu verso é um tiro, ladrão, vou meter bala
Quer me destruir? Faz um teste com esse marginal
Mídia que crítica, nem me liga, playboy passa mal
Zip, boca fechada, click, fotografou
Eu sou o retrato do agressor
Aquele que a elite odeia, segura o tranco
Sou pela paz mas, aí, não sou santo
Desfigurado é meu passado, não chame o resgate
Aí, Gog, tô preparado pro combate (demorô)
Dias de chuva, rajada sobre o mar
O mar é a favela, aqui não é novela
Manhã escura, chove sem parar
O mar é a favela, aqui não é novela
Dias de chuva, rajada sobre o mar
E na enxurrada vários sonhos se vão parceiro, guerreiro
Manhã escura (escuta aí, escuta aí que é pra você), chove sem parar
Viva a favela, viva a favela, ô
E aí, mãe, gostou?
Tá de parabéns, meu filho ('brigado)
Um abraço, fique com Deus
Um abraço muito forte pra senhora também
Te amo demais
Um abraço, tchau!
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