Levaram nossos filhos, nossos irmãos, nossos pais Nossos avós, nossos bisavôs e tata-ravós Todos mortos no mesmo dia Esse dia longo que persiste em não acabar Foram mortos pelas mesmas mãos que mudam de corpo Mão do mando de gente que tem as leis, o dinheiro e as armas a seu favor É a mão do capitão do mato, que está atrás de cada homem fardado É a mão de gente que dá nome a avenidas e estradas que atravessam essas terras Mas lembrem-se: Foram nossos filhos que morreram indigentes Sem a proteção das leis e sem a satisfação do dinheiro Foram nossos filhos que morreram, não tiveram funeral, não viraram monumento e nem nome de rua Eles viveram! Viveram 13, 15, 20, 30 e 40 anos Nós carregamos eles em nossa barriga, nós demos à luz, nós demos a vida E isso nós não vamos esquecer Porque que não podemos falar o nome dos nossos filhos? Porque querem que a gente esqueça o nome deles? Porque querem arrancar esse pedaço de nós? Não esqueceremos essa parte amputada Essa dor que dói como uma fisgada E vocês? Vão ajudar a minha mão a erguer os mortos? Vão ajudar a erguer esses túmulos? Não deixe que meu grito se transforme em uma palavra muda a ecoar pela paisagem Me ajude a barrar as rajadas das metralhadoras Pois não se esqueçam: eles morreram como filhos, irmãos, pais e avôs Não como terroristas e nem como escravos Lembrem-se que é sangue nosso que rega essa terra É sangue nosso que dá de beber à lavoura E dá liga ao cimento a cada nova cidade E, se querem secar nossas lágrimas E, se querem que nossos mortos virem comida de saúva É nosso dever não deixar Mesmo que me ameacem com fuzis Mesmo que me aprisionem com as leis Não podemos ter medo da bala Não podemos ter medo do açoite Eles não vão viver alimentados do meu medo