Não quero ir, eu tenho paz aqui Para me abrir eu tenho que me fechar em ti Não quero ir, tenho paz aqui Para me abrir tenho que me fechar em ti Abri as portas deste armário, o necessário estava lá Nas gavetas dos percursos, fechei rumos que iam dar Outras praias, outros mundos, mas o muro estava alto São memórias de outros fumos o que fomos no passado Discussões de madrugada, dizem que a terra é quadrada Vi a noite tão estrelada que, contudo, eu discordava Pois eu vi-me numa cúpula que agrupa cada ser Cada um tenta e incuta a sua ideia do presente Só que eu escrevo contra o vento, procuro ainda ter tempo Só que eu penso contra o senso de quem é comum para sempre Nesta frente o sol é quente e há mais gente a querer somente Esta areia em que me sento para sentir cada momento Ampulhetas de cimento teimam em estagnar ideias Criam teias no teu cérebro, mas és tu que não te deixas Só te aleijas nas tuas teimas, tu podias, tu querias Passam dias, tu devias ser maré P'ra sorrir o que sorrias, nadar e não ter mais pé Brincar com as alquimias, misturar vontade e fé Mergulhei além da linha, na ilha sou só gaivota À espera que a maré suba para traçar a minha rota Para que a velhice me engula até lá eu estou tão solta Mas a ria alicia-me e eu quero aquela concha Que enterrada está tão surda e ao vir cá acima me conta Como a vida já foi sua quando ainda ia às costas De alguma criatura que partiu e já não volta Casca que virou memória, carapaças são a história De ondas que se nos demoram E isto encharca-me a retórica Já não vejo aquele barco, onde está o pescador? Falta-me tudo e há algo que me faz querer repor-te Travessias trazem sargos ainda salgo e seco o peixe Não aprendi tudo exato, que pena do meu desleixo Tu contavas, ajudavas-me a apanhar os caranguejos Corrias com as tuas linhas, todos riam no desfecho Armadilhas que fazias enquanto solto um bocejo Dias teus, saudades minhas agora já não te tenho Mas sempre desaparecias, corrias atrás das luas Presságios ou alegrias tuas? Desta vez sei para onde ias E a tua barca ainda flutua, eu vejo as coisas mais cruas As conchas já não tão surdas Mesmo andando pelas ruas 'tou sentada nas tuas dunas Eu estou sentada nas tuas dunas Eu estou sentada nas tuas dunas Eu estou sentada... Não quero ir, eu tenho paz aqui Para me abrir eu tenho que me fechar em ti Não quero ir, eu tenho paz aqui Para me abrir tenho que me fechar em ti