Ponho a mão à minha frente Mas não quero esmola Moeda, cigarro, caixinha de fósforo Ponho os óculos escuros Cego enxergo tudo e o futuro A fruta que afunda no asfalto Fujo de conversa e de sirene Mas não tenho medo de tapa De berro ou de grade ou de bala Vivo num buraco Finjo que sou rico, tô deitado Num plástico preto fechado na cara O que quer o anjo de asas de papel? Queimando as próprias asas lá no céu Olha uma criança viva e gorda Grita pelo out-door E o sol reflete na lata Cada um é cada um Um Pierrô, cetim no mangue Quem dança, quem ama, quem mata? Um zumbido, quem? Um corte, um tiro, uma alegria Um helicóptero, a câmera filma do alto A paisagem dorme e finge Faz de conta que não é com ela Jornal ou novela de nylon O que quer o anjo de asas de papel? Queimando as próprias asas lá no céu Abusado, deita o corpo azul cansado Ele é o teu irmão A lua na mão, ilumina Ninguém pega, ninguém olha Ninguém fode, ninguém pode ver Na rádio ou TV, minha mina Sei o nome da palavra O nome do cagueta é tesão Algema na mão, quem ensina? Quando rima, põe o pau no lombo O escombro desce com a chuva É viúva do que contamina O que quer o anjo de asas de papel? Queimando as próprias asas lá no céu Fóssil novo do desgosto Dentro do barranco com vista pro mar Depois do jantar, vai pro living Quem te viu e quem te vê De cílio, blush, batom, rouge, é pra quê? Se tudo em você tá mentindo Dança manco, fala gago Chora seco, dá um soco no ar Merreca é fugaz, fico rindo Mano a mano com seu passo a passo Pouco a pouco ela só quer sonhar Um sonho vulgar, quase lindo O que quer o anjo de asas de papel? Queimando as próprias asas lá no céu As paredes são de lata O vento vem e espalha a areia no ar Cobrindo o lugar com seu muro Transparente, sem ninguém O som mortalha de quem quer cantar Inunda o que há no seu mundo Nem a grana, nem museu Amor ou tumba podia guardar Tudo aquilo que já foi pro fundo Nem naufrágio, nem jornal, memória E se alguém perguntar É melhor encontrar outro assunto