Não tem texto pra acabar Também não tem um final pra reluzir O lado fosco da conquista A partida, O parir, O sangrar, O tremer. Do oco do corpo Os sinais de cansaço E o sanhaço cantando. É manhã. O ruço dissipa o adeus, O frio inaugura o inverno E antecipa os suspiros. Sonho? Vida? Vulto? Sombra? Quê que há no real que tem por sina O talento do moedor de carne E não do moinho de vento Nas hélices congestionadas Dos gigantes de Dom Quixote. Quanto mais me explico Menos você me entende, Quanto mais me clareio Menos sombra temos. Mar tempestuoso, Trovão, labareda E quimeras em teus olhos grandes Meu coração é a maçã Na mira de Guilherme Tell. E o desfecho, minha cara, Escondemos num bilhete escrito fim. Entre as páginas noturnas Tantas juras, tanto sim, Que esquecemos a tragédia, A clausura e a peste, E o amor, terra agreste. A paixão, querosene e fagulha, Queimou meus navios Assassinou nossas núpcias. E como quem luta contra o tempo Luto eu contra o momento De tacar fogo nessa memória E consumir a própria perda, Esse planeta que gravita Muda marés, atiça o grito Colide sonhos e concretudes E o que sobra flui suspenso na poeira No fino halo das estrelas Que já se apagaram E ainda vemos. Vê que coisa, minha cara, Como nós, Já se apagaram E ainda vemos.