A cena é o interior do sertão nordestino Na casa grande da fazenda Sentado de cócoras na varanda Um velho senhor fumava seu cachimbo Quando vê se aproximar dele Um repórter com crachá da Network Cable TV E começa a perguntar para ele O que é que ele sabia do país onde ele vivia? Que informação ele recebia, morando num lugar tão distante? O velho senhor tirou o cachimbo Olhou para o repórter e começou a falar Tô vendo tudo, tô vendo tudo Fico calado, faz de conta que sou mudo Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado, faz de conta que sou mudo Um país que crianças elimina Que não ouve o clamor dos esquecidos Onde nunca os humildes são ouvidos E uma elite sem Deus é quem domina Que permite um estupro em cada esquina E a certeza da dúvida infeliz Onde quem tem razão baixa a cerviz E massacram-se o negro e a mulher Pode ser o país de quem quiser Mas não é com certeza o meu país Oh-oh-oh, oh-oh-oh Oh-oh-oh, oh-oh-oh Um país onde as leis são descartáveis Por ausência de códigos corretos Com 40 milhões de analfabetos E maior multidão de miseráveis Um país onde os homens confiáveis Não têm voz, não têm vez, nem diretriz Mas corruptos têm voz e vez e bis E o respaldo de estímulo incomum Pode ser o país de qualquer um Mas não é com certeza o meu país Oh-oh-oh, oh-oh-oh Oh-oh-oh, oh-oh-oh Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado, faz de conta que sou mudo Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado, faz de conta que sou mudo Um país que perdeu a identidade Sepultou o idioma português Aprendeu a falar pornofonês Aderindo à total globalidade Um país que não tem capacidade De saber o que pensa e o que diz Que não pode esconder a cicatriz De um povo de bem que vive mal Pode ser o país do carnaval Mas não é com certeza o meu país Oh-oh-oh, êh-oh-oh Êh-oh-oh, êh-êh-oh Um país que seus índios discrimina E as ciências e as artes não respeita Um país que ainda morre de maleita Por atraso geral da medicina Um país onde escola não ensina E hospital não dispõe de raio X Onde a gente dos morros é feliz Se tem água de chuva e luz do sol Pode ser o país do futebol Mas não é com certeza o meu país Oh-oh-oh, êh-oh-oh Oh-oh-oh, êh-êh-êh Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado, faz de conta que sou mudo Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado, faz de conta que sou mudo Um país que é doente e não se cura Triunfal candidato ao quinto mundo Que do poço fatal chegou ao fundo Sem saber emergir da noite escura Um país que entregou a compostura Atendendo a políticos sutis Que dividem o Brasil em mil Brasis Pra melhor assaltar de ponta a ponta Pode ser o país do faz-de-conta Mas não é com certeza o meu país Êh-oh-oh, oh-oh-oh Êh-oh-oh, êh-êh-êh Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado, faz de conta que sou mudo Tô vendo tudo, tô vendo tudo Mas fico calado... Calado, mas não sou mudo, ó